quinta-feira, 7 de junho de 2012

Um caminho para terra do nunca



Acho que ninguém lembrou de dizer para ele, em algum momento, que ele poderia fazer diferente. Poderia ir fazer um curso, dançar só nas festas da turma, ou nada disso. Esqueceram de dizer que ele não era mais obrigado. Poderia seguir uma rotina comum, de gente comum. Acho que esqueceram de avisar que se ele não quisesse mais aquela vida, poderia parar. Seu pai não mais o puniria por isso. Acho que esqueceram de dizer que ele não deveria fazer o que eles não podiam fazer. Não poderia ter um parque, nem gastar os milhões que ele, e somente ele, lutou para conseguir, da forma que ele desejasse. Acho que esqueceram de dizer que no mundo de gente grande ter desejos lúdicos é pecado. Tentar ser feliz então, nem se fala, uma afronta. Ser feliz? Isso nem se discute, para os adultos isso não existe. Não se tem tempo para isso, ora! Acho que não disseram para ele que não adiantava explicar, se, mesmo tendo suas verdades, eram as mentiras que eles queriam. Não importava que o acidente tivesse queimado seu cabelo, quebrado seu nariz ou mudado sua cor. Esqueceram de avisar também que, se fosse só vaidade mesmo, ele não devia explicações a ninguém. Talvez se ele fosse um legítimo adulto, que colecionasse relações grotescas com mulheres e/ou homens e/ou drogas e/ou bebidas, tudo estaria certo. Se ao menos ele guardasse todo o dinheiro do seu trabalho ou doasse, mais ainda, para as crianças carentes – aquelas por quem eles mesmos não faziam nada além de fingir preocupação. Mas, não. Ele pecou muito, muito mesmo. Gastou do que ganhou, o que quis, como quis. Brilhou, indiscutivelmente. Gostava de bichos, brinquedos e crianças. E, além de tudo isso, encontrou um caminho para a Terra do Nunca. Mas, por fim, ninguém o avisou que ele poderia ficar tranqüilo, o problema não estava nele. O problema era que ele tinha talento demais, dinheiro demais, possibilidades demais, sucesso demais e luz demais e - estivesse errado ou não, pecando ou não - ele precisava pagar. Porque eles não tinham.

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