domingo, 28 de julho de 2013

Licença

Faz alguns meses que estou em silêncio, totalmente mergulhado em mim mesmo. Não escolhi conscientemente isso, mas resolvi abraçar a solidão como uma oportunidade. Lembro Frida ao perceber que sou o assunto que melhor conheço. Conheço todos os meus sentimentos e por isso me respeito com cuidado e carinho.

Faço hoje por mim o que ninguém fez, permito-me a primeira pessoa.

Algum tempo atrás, talvez uns dias, eu era um menino caminhando por um mundo de cores, com formas claras e tangíveis. Tudo era misterioso e havia algo oculto; adivinhar-lhe a natureza era um jogo para mim. Se você soubesse como é terrível obter o conhecimento de repente - como um relâmpago iluminado a Terra! Agora, vivo num planeta dolorido, transparente como gelo. É como se houvesse aprendido tudo de uma vez, numa questão de segundos. Minhas amigas e colegas tornaram-se mulheres lentamente. Eu envelheci em instantes e agora tudo está embotado e plano. Sei que não há nada escondido; se houvesse, eu veria.'' Frida Kahlo

Do amor

Chegando na encruzilhada
Eu tive de resolver:
Para a esquerda fui, contigo.
Coração soube escolher!
(Guimarães Rosa)

Amor, eu te peço perdão. Se sempre foi o meu tema favorito, meu anseio, minha busca; foi quando te encontrei de verdade que calei. Fiquei silencioso diante da experiência linda e imerecida de encontrar o amor. Revi meus conceitos, meus textos e minhas resoluções. A espera me pareceu tão curta, amor. Tu és menos espalhafatoso do que dizem. Realmente há em ti a força alegre que dizem, mas é uma força tranquila, muito tranquila. Descobri que tu tens um jeito misterioso, cuidadoso, sutil e, despudoradamente, simples. Deveria ter anunciado aos quatro cantos que te encontrei. Mas o encontro foi tão surpreendentemente diferente que eu me calei. Como a gente se cala diante de milagres, envolta em uma atmosfera de surpresa, sem acreditar no que essa vendo. E eu te vi, te vejo e me surpreendo, agradeço e me calo. Desculpa, amor, não é ingratidão. É que me parece um segredo inviolável. Parece que as pessoas não vão entender ou não acreditar ou as duas coisas juntas. Então eu guardo com carinho torcendo que eles te recebam um dia com a mesma candura. Porque, amor, eles não acreditam mais. Eles te confundem com tudo, absolutamente tudo. Eternizaram em filmes e livros mentiras a teu respeito e as pessoas passam a vida reclamando que não te encontram. Elas não sabem que estão desejando tudo, menos a ti, amor. Não aceitam segurança, paz, espera, amizade. Não aceitam o amor como o amor é. Se eu contasse, eles também não acreditariam. O mundo anda tão ruim, que as pessoas andam se recusando a coisas boas. Não está fácil por aqui, amor. Mas você existe. E é tão milagrosamente possível. Também tive dúvidas, também desacreditei. Por isso guardo o silêncio do encontro tão desejado, mas julgado tão incerto. Por isso me desculpe, amor, por não ser justo de te escancarar depois de tanto desejá-lo. Ainda vou contar de ti. Um dia, logo. Mas por enquanto não vai embora daqui. Nunca mais, sim?

sábado, 11 de maio de 2013

A dor que dói mais

Em meio a lágrimas, em uma cidade qualquer, em um dia qualquer, em um momento único pensei:

"Sabe moço,trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, dóem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade.

Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância. Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e menos cabelos brancos. Dóem essas saudades todas.

Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde. Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.

Saudade é não saber. Não saber mais se ele continua se gripando no inverno. Não saber mais se ela continua clareando o cabelo. Não saber se ele ainda usa a camisa que você deu. Não saber se ela foi na consulta com o dermatologista como prometeu. Não saber se ele tem comido frango de padaria, se ela tem assistido as aulas de inglês, se ele aprendeu a entrar na Internet, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua fumando Carlton, se ela continua preferindo Pepsi, se ele continua sorrindo, se ela continua dançando, se ele continua pescando, se ela continua lhe amando.

Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.

Saudade é não querer saber. Não querer saber se ele está com outra, se ela está feliz, se ele está mais magro, se ela está mais bela. Saudade é nunca mais querer saber de quem se ama, e ainda assim, doer".

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Começo

Já escrevi uma vez sobre ‘Fim’. Eu gosto de fins. Mais do que isso, às vezes, eu preciso deles. Não encaro com drama, encaro com resignação. Não acho que tudo tenha fim. Acho que algumas coisas são para sempre (mas isso é assunto para outro texto, sim?). Hoje eu reconheço um fim. É um fim secreto. É uma daquelas situações em que você aceitava tanto uma coisa que nem parecia que incomodava mais. Mas aceitar não é concordar. E nem acomodar. Eu decreto fim. Dispenso a loucura. Dispenso mil vezes a mentira, dispenso, dispenso! Dispenso os julgamentos. O fim não me angustia, pelo contrário, o fim me inaugura o novo e me abre uma oportunidade. Fim. Ponto final. Enfim, mais um ciclo se fecha. São tempos de mudanças. Se hoje tenho um fim, hoje tenho também um começo.

domingo, 10 de março de 2013

in-finitude

Há um lado do "até quando" que me conforta:
nossa capacidade de repetir erros e acertos,
com uma fé tamanha, que acabamos surpreendidos
ao constatar que pouca coisa muda,
mas seguimos na roda, a repetir erros e acertos.

Há, na forma como vemos a vida, uma infinitude irreal,
uma irresponsabilidade perante nós mesmos.

Há um "por que" despercebido, subjulgado;

Há um "prá onde" desorientado;

Mas, felizmente, há um "com quem"
que empresta sentido a todo o resto,
que faz doce,
que faz reto,
que faz direto.
Ah! Esse modo mágico, provisório e delicado
que a vida tem de passar por nós
como se nos levasse junto...
mas ficamos.

Fala coração!!



É melhor ir devagar. Ela disse.

Em seu coração o desejo de ser desobedecida: não sejas devagar, seja imediato. Entra sem pedir licença, queima tudo que ainda dói com a simples luz de tua entrada, não faz perguntas, não tenha cautela. Abre teu espaço e ocupa o que quiser. Ocupa-me. Não me dá opções, não me deixe ser prudente. Não me deixe ponderar, nem discursar sobre o que aprendi. Não aprendi ainda, ensina-me. Rápido, não me permita pesar. Há uma urgência de você.

Mas o coração dela não falava.