domingo, 5 de fevereiro de 2012

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“E quando chega essa hora da noite eu me desencanto. Viro outra vez aquilo que sou todo dia: fechada, sozinha, perdida no meu quarto, longe da roda e de tudo: uma criança assustada”. Caio Fernando Abreu

Sente aqui, vida. Vamos conversar. Tens teus direitos, és mantenedora e a única legitimidade que me permite estar aqui. Mas também devo ter os meus. E se não os tinha, eu os criarei de agora em diante. Pois já chega de brincar com os sentimentos alheios, já chega de tirar o chão quando a brincadeira está ficando boa. Não me ameace mais, por favor. Mal posso imaginar seus olhos indiferentes, frios às minhas lágrimas e meus pedidos. Não me faça acreditar que somos merecedores, nem me faça te desafiar sabendo que vou perder. Ah não, vida, não ria assim de mim. Seja benevolente, o mínimo que consiga, e me deixa conseguir um pouquinho do que preciso, e tens relutantemente me tirado. Não me deixe nesta solidão de sentimentos. Não me olhe assim! Não, não. Não vira as costas para mim. Pode me olhar, então. É preferível ao significado de total indiferença que tuas costas me trazem. Eu gosto de você. Não estou apelando, mas bem que poderia ser. Pode me levantar nos braços, tirar os meus pés do chão, mas me devolva, por favor. Não me deixa pagar pelas escolhas deles. Alivia um instante que seja. Permita-me buscar o ar e, pronto, volto para a sua brincadeira. Esta, a que desde o começo dos dias fui obrigado a brincar. Quando cansar, vida, já pode parar. Eu já quero descer.

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